quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Produção e identidade das bandas

E aí pessoal, tudo certo? Esse post acabou demorando um pouco mais que o esperado para sair, mas agora vamos recuperar esse tempo perdido. Primeiramente, quero agradecer ao pessoal que vêm visitando o blog, o número de visitas vem crescendo razoavelmente, isso dá a impressão de que a) alguém achou interessante, ou b) as pessoas andam meio sem ter o que fazer. Enfim, vamos começar.
Já que o último texto foi sobre produção, gravação e coisas do tipo, acho que é interessante falar sobre um tema que é parte integrante da música em geral. A coisa importante a ser notada é:

O som que uma banda tem fala muito a respeito da sua identidade.

Ok, parece uma coisa meio óbvia, mas exatamente por estar muito na cara, às vezes as pessoas deixam esse detalhe passar batido: acho que o pessoal que tem banda ou pensa em ter uma deveria pensar muito a respeito disso, e vou mostrar alguns exemplos de como isso acaba tornando-se algo importante com o passar do tempo.
No início da década de 1980, aconteceu o "boom" da NWOBHM, a New Wave of British Heavy Metal. Haviam muitas bandas que possuíam características sonoras parecidas: Iron Maiden, Saxon, Judas Priest, entre outras. Embora amadas no underground, muitas delas acabaram caindo no esquecimento, e outras (como as que acabei de citar ) foram reconhecidas e mantém carreira estável até hoje. De certa maneira, quando surge um estilo, aparecem algumas bandas que conseguem mostrar suas raízes e ao mesmo tempo adicionar elementos novos: as que simplesmente copiam características do estilo em si, normalmente acabam estagnando sua carreira em algum lugar. Não quero dizer que todas as bandas deveriam alcançar um nível fora do comum, com shows lotados em estádios e etc, mas buscar uma cara própria dentro do seu estilo é algo que deveria ser procurado.
Continuando com a NWOBHM: dentre todas as bandas, houve uma que soube usar muito bem essa questão de identidade e produção pra se destacar das demais. Trata-se de um trio formado por três carinhas muito feios, que decidiram utilizar pseudônimos ao invés de seus nomes próprios, ou nomes artísticos comuns. Sim meus caros, refiro-me a Cronos, Mantas e Abbadon, do Venom. eles faziam praticamente tudo igual às outras bandas: influência do punk misturado ao "heavy metal" (led zeppelin, deep purple), solos de guitarra, e a vontade de soar pesado. As diferenças começam quando Cronos, numa entrevista, diz que o que eles praticavam era, na verdade, black metal, e não heavy metal.
Ok, além dele usar um rótulo que distanciava sua banda das demais, Cronos também trabalhava em estúdio, e viu a maioria das bandas da NWOBHM gravarem seu material. Outra grande diferença foi a de sujar muito mais seu som. Assim, o Venom construiu pra si a imagem de ser mais sujo, feio e mais malvado que qualquer outra banda que estivesse por ali na época. Muita gente achou palhaçada, mas muita gente concordou, e o resultado é que a maioria das bandas mais pesadas que vieram depois citam Venom como influência.

Indo um pouco mais pra frente na linha do tempo, a gente tem um estilo inteiro que é definido por guitarras em tons graves, um baixo que normalmente não é ouvido (e quando dá pra ouvir, é porque o baixista toca pra diabo), e com muitas notas na bateria... Muitas notas mesmo. Isso mesmo, death metal.
Podemos dizer que o primeiro padrão de produção dentro do death metal surgiu a partir do estúdio Morrisound, na Flórida. Morbid Angel, Obituary e Death foram algumas das pioneiras em gravar por lá.
Nessa parte da história o Brasil entra, via Sepultura e seu disco Beneath the remains. A gravadora Roadrunner records havia gostado do som do Sepultura (juntamente com boa parte do underground mundial), e decidiu fechar um contrato com eles. A gravação de um disco com padrão de produção internacional era importante para a gravadora ter um disco bom para trabalhar em cima, e para a banda se firmar como potência. Então, o produtor Scott Burns, que trabalhava no estúdio Morrisound veio para o Brasil. Resultado: diversas bandas citam Beneath The Remains" como um disco que foi guia para a produção de seus próprios álbuns, como o Cannibal Corpse com seu debut Eaten back to life e o Napalm Death com o Harmony Corruption, pra citar os mais "fraquinhos".

Na contra-mão do som de death metal da Flórida, surge o black metal escandinavo, que faz questão de fazer exatamente o contrário: ter uma qualidade de som "ruim", guitarras mais estridentes e uma produção que soa muito mais crua. Ah sim, além dos primeiros trabalhos do sepultura, eles são muito influenciados pelo Sarcófago.
Transilvanian hunger do Darkthrone é um disco que serve muito bem pra exemplificar essa visão.

O assunto não acaba por aí, mas com base nisso tudo é possível notar que o jeito que o disco de uma banda soa tem a ver com diversos fatores, como referências dos caras envolvidos na gravação, qual a idéia que a banda pretende passar com as suas músicas, equipamento disponível, carga de conhecimento que os envolvidos possuem, o quão complexa é música (bandas com composições muito técnicas acabam tendo que limpar um pouco a produção, como o caso do Necrophagist) a além do fator caos, que sempre aparece em maior ou menor medida em alguma gravação, escondido nos detalhes que não foram levados em consideração.
No fim das contas, depois de ver tudo isso, você pensa "mas como diabos eu preciso gravar pra estar de acordo com determinado estilo" ou então "como eu vou saber o que é certo nesse estilo? ". A parte legal da música é exatamente essa: não existe uma definição de "certo" ou "bonito" . O que é legal pra uma banda pode ser uma bosta pra outra, o mesmo para as pessoas que ouvem a música.

O próximo post não será sobre gravação, vou tentar falar sobre bandas ao vivo ou qualquer outra coisa que venha à cabeça: se alguém tiver alguma sugestão, fique à vontade pra entrar em contato através de f.augustus@gmail.com

Até mais

terça-feira, 20 de julho de 2010

O home studio

Agradeço a todas as pessoas que visitaram meu blog, espero que a experiência de leitura da minha primeira e breve postagem tenha sido de algum proveito, ao menos para distraí-los por alguns minutos. O fato de ter recebido mais de dez visitas me deu ânimo para fazer mais postagens, então hoje decidi compartilhar com vocês mais opiniões subjetivas e embasadas na minha curta experiência dentro do metal underground.
O tema escolhido hoje, senhoras e senhores, é gravação. Não pretendo entrar em pormenores técnicos, apenas dar linhas gerais de como era infernal fazer uma gravação caseira antigamente, e como a situação passou por uma sensível mudança com a chegada de periféricos de computador voltados para gravação. Vamos começar com uma breve lição de história: os equipamentos de gravação antigamente (dos anos 80 até fim de 90, mais ou menos) eram razoavelmente caros e difíceis de conseguir: gravadores portáteis caseiros que permitiam gravação em vários canais ainda eram artigos que não apresentavam uma fidelidade de som comparável aos estúdios.
Resumo da ópera: quem queria ter um som legal, acabava indo para o estúdio porque não tinha muita escolha, e ainda assim podia não conseguir grandes resultados.
Mesmo assim, estamos falando de metal, e tocar em condições precárias era uma constante para os pioneiros do estilo (e ainda é para algumas bandas hoje em dia).
O primeiro nome que me vem à mente é a banda sueca Bathory: um dia eu peguei emprestado o álbum Blood on Ice com um amigo. Nessa prensagem do álbum havia um longo texto do compositor e músico que manteve a banda por toda sua existência, Ace Thomas Forsberg, mais conhecido como Quorthon, falando sobre as condições sob as quais a banda trabalhou.
O estúdio Heavenshore, no qual alguns dos primeiros álbuns da banda foram gravados, era na maior parte do tempo uma oficina de carros que funcionava em uma garagem(!). No primeiro álbum a bateria possuía somente um bumbo: nessa época não haviam pedais duplos de bateria, logo as poucas partes que possuem bumbo duplo nesse álbum foram gravados com o uso de baquetas(!), sem contar que a bateria foi gravada somente com dois microfones (geralmente, usa-se um microfone para cada tambor, além de dois ou mais microfones para captar a ambiência, o som geral da sala). Esse com certeza não é o único exemplo de uma banda gravando um álbum de metal em condições ruins, mas serve para ilustrar bem as coisas pelas quais uma banda precisa passar quando tem um orçamento baixo.
E já que estamos falando de orçamento baixo, chegamos às minhas experiências de gravação. Aprendi o básico de gravação no computador fuçando juntamente com meu ex-colega de banda Ruben, nos tempos em que tocava em uma banda chamada Veilhalt: foi aí que comecei a descobrir algumas coisas sobre a gravação de guitarra, programação de bateria eletrônica, e uma coisa realmente importante para um cara que toca metal extremo: aprenda a usar o maldito metrônomo!
Com essa banda, chegamos a gravar uma demo em um estúdio de verdade, que possui certo renome. A experiência de já ter gravado em casa diminuiu um bocado a tensão existente da primeira vez que se entra em estúdio, principalmente porque gravar diversas vezes em casa para fazer as linhas-guia (um esboço da música que serve, como o nome indica, para guiar a gravação dos demais instrumentos) fez com que eu estivesse ensaiado.
Bom, essa gravação aconteceu em meados de 2005: em 2006, acabei por sair da banda e me mudar. Passei então a compôr para o meu então futuro projeto de death metal, que é minha banda atual, DISCORDIA. Na época, eu tentava ler o máximo possível para poder saber o que utilizar como equipamento de gravação, além dos diversos tipos de efeitos existentes. Compus uma música completa, vendi o cabelo para poder comprar um baixo e decidi brincar de one-man band. Essa primeira demo, intitulada The ultimate degradation circulou em pouquíssimas cópias em cdr, e com certeza teria uma qualidade um pouco pior do que teve se não fosse o pessoal de outra banda à qual eu fazia parte nessa época, a hoje extinta Shadowlands(infelizmente não tenho registros gravados da Shadowlands). Nosso baterista havia montado um home studio em sua casa, e eu usei a demo da DISCORDIA, até então uma espécie de projeto-solo, como método de aprendizagem para gravação. Tive que bater muita cabeça até descobrir que ganho demais na gravação das guitarras deixava tudo uma merda, e ganho de menos também deixava tudo uma merda: o processo de gravação de três músicas tomou um mês, sendo que na última semana, a da mixagem (parte do processo em que se ajustam os volumes de todos os instrumentos, adicionam-se ecos e coisas do tipo) eu chegava a trabalhar dez horas por dia nas músicas. Hoje em dia, ao ouvir essa primeira gravação, eu sinto certo orgulho, uma vez que esse processo todo apurou meus ouvidos para o meu estilo e ajudou em muito na última incursão da DISCORDIA em estúdio, ocorrida em 2009, agora com uma formação completa. O material que está em nosso myspace é uma prévia dessas sessões de gravação, que ainda não foram lançadas, mas que brevemente verão a luz do dia.
Ok, depois dessa imensa digressão falando do meu próprio umbigo, vamos voltar um pouco ao assunto da gravação em casa: um home studio que suporte a gravação de um álbum inteiro é um tanto quanto salgado para os bolsos brasileiros, mas existem muitos equipamentos com um custo x benefício legal para quem quer fazer demos ou versões mais simples, tanto para aprender a mexer com gravação quanto para poder trabalhar melhor suas composições antes de entrar em estúdio.
Basicamente, é necessário um programa editor de áudio (eu particularmente gosto do Cakewalk Sonar, mas existem muitos outros), memória RAM (quanto mais melhor, lembre-se disso), e alguma maneira de fazer seu instrumento ser ligado ao computador. Isso pode ser feito através de uma placa de áudio interna (a minha é uma audiophile 2496, custou por volta de 400 reais), placa de áudio externa (fica literalmente mais à mão, acabam tendo alguns controles externos de volume ou coisas do tipo, mas são mais caras) ou equipamentos que misturam placa de áudio com processador de efeitos (A empresa line 6 possui alguns desses).
Se você gastou um pouco mais na memória RAM, fica mais fácil usar efeitos de guitarra dentro do próprio programa editor de áudio, mas se você já tiver uma pedaleira acaba economizando essa memória pra fazer mais coisas na mixagem (adicionar mais delays, gravar mais canais pra deixar o som mais "gordo" ou coisa do tipo). Uma das partes mais complicadas ($$$$) é monitorar o som: os monitores (vulgo "caixas de som") não costumam sair muito barato, então a opção mais barata são os fones. Existem diversas marcas boas atualmente, veja a que se encaixa no seu bolso.
Agora a coisa mais importante, que me fez lembrar do falecido Quorthon, é a seguinte: não interessa o equipamento que você tem, o importante é tentar extrair do seu equipamento o máximo possível, porque uma música ruim nunca vai se salvar com produção boa.


Links referentes:

Bathory: http://www.bathory.nu/x1.htm
Veilhalt: http://www.myspace.com/veilhalt
Estúdio AV Works (estúdio do mais mais recente trabaho): http://www.avworks.com.br/

terça-feira, 13 de julho de 2010

Mas por que você ouve música de revoltado?

Aproveitando o Dia Mundial do Rock (data tão festiva), decidi iniciar esse projeto de colocar meu ponto de vista sobre diversos assuntos, ligados de maneira direta ou indireta ao metal no Brasil e no mundo: espero que os fãs de metal (e as pessoas curiosas a respeito do estilo) possam aproveitar alguma coisa desse amontoado de palavras. O que diabos me dá respaldo para falar sobre isso? Fora fazer parte da cena com uma banda que está iniciando, não tem muito mais coisa. Mas como o papel e a tela do computador aceitam tudo,vejamos o que vai sair. Ok, começando de verdade agora.
A frase que dá título à primeira postagem desse blog é velha conhecida de muitas pessoas que ouvem música pesada. Todo o cara que começa a deixar o cabelo crescer, cria um gosto por roupas escuras (ou com estampas dos demônios do Dark Funeral, zumbis assassinos do Cannibal Corpse e afins) já teve que ouvir a ladainha de que estava sofrendo más influências, atraindo para si muita "energia negativa" por causa desse monte de barulho satânico, spikes e roupas escuras.
Já posso imaginar hoje à noite, a reportagem com um formato que se repete nos telejornais há um certo tempo: Elvis, Jimi Hendrix, Raul Seixas. Aí passa pelos punks (rapidinho por favor, não pode ter punk na tevê) e o pessoal do heavy metal, colocando a língua de fora e parecendo retardado mental.

Não vou perder meu tempo tentando derrubar todos os clichês que cercam as vertentes mais pesadas do rock, simplesmente porque quem quer a visão padronizada e fácil da coisa sempre vai preferir ouvir o ponto de vista com maior prestígio. O máximo que eu posso fazer é apresentar um ou outro argumento, com base em duas indicações que me parecem interessantes. O primeiro é o documentário "Metal: A headbanger's Journey". Um fã de metal formado em antropologia decide estudar a cultura heavy metal (finalmente alguém que não usa o termo "tribo" pra designar um grupo de pessoas), e entender por que ela trata de temas indigestos para a maioria das pessoas, entre outras coisas. A resposta a que ele chega realmente faz sentido para mim: muita gente gosta de lembrar só do lado bonito da vida, e o metal de certa forma faz com que as pessoas entrem em contato com suas regiões mais instintivas, através da música intensa e alta.
Outra citação interessante é a música Masters of Death, que está no disco Serpent Saints - The Ten Amendments (2007), da banda sueca de death metal Entombed. Essa música faz algo que está se tornando razoavelmente comum: listar as influências de uma banda dentro da música, mas a melhor parte na minha opinião é o trecho mais lento no meio da música, em que entra a s estrofes:

Darkness is living in me
Helping me see
Be all I can be
Whole, Hey! Ho!
We are Satan's people

I love it like you love Jesus
It does the same thing to my soul
Hey! Ho!
I got a life-long love for
The occult.

Podem continuar achando que fã de metal tá com raiva do mundo(diga-se de passagem, se estiver até tem bons motivos pra isso), que é tudo maluco e etc, essa parte da letra aí em cima já diz muito a respeito.


Referências citadas:

Dark Funeral: http://www.myspace.com/darkfuneral
Cannibal Corpse: http://www.myspace.com/cannibalcorpse
Metal: A Headbanger's Journey: http://www.metalhistory.com/
Entombed: http://www.myspace.com/serpentsaints


Por último e menos importante, o myspace da minha banda: www.myspace.com/discordiadeath